Caminhava distraída quando ví. Estava lá, parado. Seus olhos serenos eram de uma verdade profunda, cheios de significados. Brilhavam. E me fitavam insistentemente.
Senti medo. Mas era um medo estranho. Medo da verdade. Porque aquela serenidade, de repente era o objeto desconhecido de minhas buscas.
Como assim? Sabe quando se procura algo sem saber exatamente o que é? Na verdade se sabe, mas em sombras, em imagem. Não se conhece de já ter visto, mas de acreditar em sua existência...
Pois bem. A certeza do encontro, inesperado mas ansiado, foi tão grande que corri para longe. Mas ele permaneceu lá, sereno. Sorriu. E seu sorriso disse tudo. Entendeu minha reação. E como quando queremos nos aproximar de um felino arisco, filhote medroso, andou, devagar.
A cada passo me fitava como quem pergunta “posso dar mais um?”. E apesar do medo, creio que meus olhos me desmentiam. Meus pés corriam dele enquanto meus olhos pediam ajuda: “Por favo, me faça crer!”
Passos medidos. Pausados. Ele sempre andando, em ritmo constante e calmo, para frente. Eu oscilava sempre: ora tinha vontade de correr para longe, ora parada, ora andava em sua direção, ora corria para frente, mas o medo me fazia voltar.
Até que parei. Ergui os olhos e resolvi analisar a situação. O fitei. Estudei seus passos, seus sorrisos, seus trejeitos, suas reações. De longe esquadrinhei detalhes, decorei suas falas. Cheguei a saber de cor seu ritmo de caminhada, quando daria mais um passo, e como.
Me deixei ficar ali. Mas andar...será? Não é ousadia demais?
Parece que leu meus pensamentos, ou me entendeu sem precisar saber. Só ouvi a resposta: “Não, não é. Mas se quiser, apenas fique parada. Eu chego aí!”
Levei um susto: ele me entende! E fiquei, sim, parada onde estava, mas não por opção. Por pura falta de saber o que fazer. Sem reação, me perguntava “E aí, não vou fazer nada? Confio ou não? Acredito no fantasma quando diz que é real? Miragem é corpórea? Miragem sorri?”
Ele sorria. Minha insegurança devia estar estampada em minha testa. “Eu sou real. Mas não vou forçar você acreditar em mim. Confie só se quiser!”
E andava. Como, apesar de não me mexer, não dei nenhum sinal de desaprovação de seu movimento, continuou andando em minha direção. E de forma tão cuidadosa que me deu nos nervos. “Oras, corra de uma vez! Se não me mexo, porque não me surpreende? Vamos, ataque!”
Ele me fitou. “Não quero! Se conseguir chegar até você não será por violência.” E continuou andando tranquilamente. Mas me fitava. E percebi que, a certa altura, esperava algum sinal meu, algum movimento, qualquer um que fosse.
Como não me mexi, seu semblante caiu. Andava vagaroso agora. Foi diminuindo os passos. Me olhou tristonho. Seu olhar sereno possuía angústia. “Por que você não crê? Por que não vem pra mim?”
Percebi que deveria fazer algo. Respirei fundo. Porque o medo ainda rondava. Medo de não ser boa o suficiente. Medo de que ele não fosse real. Medo de andar em vão, de crer em vão. Mas vamos lá. O que tenho a perder? No máximo ele não será real, e permanecerei como estou.
“Mas vai doer”, dizia meu subconsciente. “Se não for real e você andar, terá acreditado. Terá colocado sua esperança em sombras. E a fé desiludida dói!”
Vacilei. Será que devo ir? Ele me fitou nos olhos. Aqueles olhos me amavam. Tanto que eram incapazes de me obrigar a amá-los. “Eu vou continuar andando em sua direção, já decidi. Você pode fazer três coisas: ficar parada, andar pra cá ou correr pra longe.”
Permaneci parada. Ele sorriu alegre. Havia esperança, ficar parada era melhor do que fugir. Mas andar...
Dei um passo vacilante. Seus olhos brilharam. “Você crê?” “Eu quero crer!” “Então vem!”
Comecei a andar devagar. E enquanto andava, olhar em seus olhos me fez conhecê-lo. “Confie nele”, dizia uma voz dentro de mim. “Ande e confie nele!”
Comecei a andar confiante. E quanto mais perto ficava, mais real ele parecia. Comecei a crer.
Vendo meus passos, aqueles olhos brilharam como nunca. Um sorriso iluminou sua face. Ele parou, se ajoelhou, me olhava sorridente.
Eu sorri e acelerei o passo. “Não é mentira, ele existe! Eu creio!” Quis correr, mas ele pediu que tomasse cuidado. Mas sorria, de um sorriso encantador. E sua serenidade era de uma verdade profunda, contagiante. A verdade que sempre precisei encontrar, a serenidade da verdade, do real, do ser em plenitude de propósito e de vontade. Ele existia, e ali, sorrindo, se pudesse escolher, teria escolhido existir por minha causa.
Lágrimas escorreram no meu rosto. Minha busca tinha terminado, não mais andaria distraída, nem só. Ele abriu os braços. E quando o alcancei pude comprovar que sua imagem provinha de um ser real, que na verdade era muito mais real e verdadeiro agora do que visto de longe. Seus olhos, perto assim, eram muito mais profundos. E aquela serenidade se transformou em paz e certezas.
Foi assim a primeira vez que me permiti crer e me lancei em direção a braços estendidos que, de tão completos, e por serem tanto o que eu queria, pensei estar diante de um mito. Cri, andei, me lancei em seu abraço, ali, de joelhos, entre sorrisos e lágrimas. “Me perdoe, eu não acreditava em você!” “Eu sei, mas sempre te amei!”
Estou nesse abraço ainda... e dele não sairei mais. Correr? Andar? Só se for junto aos seus passos!
"Deleite-se no Senor, e ele atenderá aos desejos do seu coração" (Salmos 37:4)
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