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quinta-feira, 30 de outubro de 2014

Luto transcedental

"não coma da árvore do conhecimento do bem e do mal , porque no dia que dela comer, Certamente morrerá." Gn. 2. 17

A vida é feita de mortes. Antagônico ? Mas é. A cada dia que passa temos um dia a menos de vida na somatória total da contagem regressiva. Credo, Elisa, que mórbido! Desculpe se estraguei seu dia, mas é a verdade.

Não que pensemos nisso muitas vezes. Afinal, nossa vida é feita de metas e tarefas a curto prazo: despertar cedo amanhã, programar o fim de semana, pagar a conta no fim do mês. No máximo emagreceremos e voltaremos a estudar no ano seguinte. E só.

Depois de (quase) trinta anos vividos, (quase) no meio da vida útil, é que percebemos que crescer é um processo de morte. Morre nossa inocência; morrem nossas ilusões juvenis, e temos a tendência de querer substituí-las por outras; morre a ingenuidade gradualmente. Aos poucos o mundo vai ficando cada vez mais real, mais maduro, mais concreto e mais sem graça. Morrem as utopias.

Um belo dia descobrimos que aquele corpo belo, saudável, flexível e juvenil que tanto ansiávamos na adoleacência passou por nós na correria da transição para a fase adulta e nem percebemos. Sim, o tivemos, dizem as fotos.

Um belo dia vemo-nos repetindo as opções, trejeitos (e ideias, algumas) de nossos pais, aqueles que julgávamos ultrapassados.

A cada ano morre uma versão de mim. Morrem amizades, pelo menos versões delas. A cada texto que leio mato um eu pensante anterior. A amante matou a virgem, o que de ruim e bom que havia nela. A cada semana a unha que cuidei com esmero morre, o cabelo que hidratei será cortado no mês seguinte, meus móveis envelhecem cada vez que os uso (e já quebrei metade de meus copos em menos de um ano), e a cada palavra digitada em meu celular (ou tablet, ou computador, ou notebook, ou ultrabook, ou smartphone, ou phoblet...) ele se torna um pouquinho mais absoleto.

Todo conhecimento é morte: mata a inocência do não conhecimento, mata a confiança cega sem pensar, mata no que se cria há segundos atrás.

Cada fase de qualquer coisa é morte da anterior. E sei que parece pessimismo, mas nâo é!

Veja bem: meu namoro matou a paquera, o noivado matou meu namoro, que morreu na noite em que casei. Mas que jeito glamoroso de se morrer, não? E aos 3 meses matamos a lua de mel (ou não?...), depois de alguns anos não seremos mais recém-casados. E vamos morrer, de fato, um dia.

Então estou de luto. Porque levei mais de um segundo, ou um minuto, para escrever este texto até aqui, e outra de mim morreu.

...

O problema é que se levar isso a sério fico em silêncio para o resto da vida (ou da morte)!! Não dá!

Concordo, portanto, com os gregos que o importante é morrer bem. Nada como a bela morte! Meu casamento foi a morte mais bonita que meu namoro poderia ter! O diploma foi uma boa morte da faculdade.

Também concordo com Bandeira que a consciência da morte nos dá a possibilidade (e sensibilidade) de desfrutar melhor de feixos de vida, ou de aumentar o número de deslumbramentos.
Carpe diem, pessoal!!

Não importa qual filosofia nos agarramos para explicar e existência, ou qual postura tomamos com os segundos que nos resta.

Eu, particulamente, como cristã que sou, defendo que cada dia é uma oportunidade a mais para conviver intimamente com o Eterno (e friamente falando, isso dá um nó filosófico, pensar que a eternidade ama a finitude e quer dividir com ela seu parco tempo disponível, até que a faça de fato eterna...xiii, neurônios dando piruetas). Mas vai de cada um.

Então, querido leitor, acabei de matar, talvez, o discurso da eterna juventude, o do amor romântico eterno e posso ter te deixado meio down; sinto informar, mas acabo de te matar, já que nunca tinha pensado nisso!

E Adão achou que Deus falava só do corpo físico: sabe de nada, inocente!!

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