Palavras. A tentativa de comunicar. Às vezes basta, às vezes
não. Elas me fogem, e só o fato de ficar assim, muda, é tão clichê que me
irrita. Não por me sentir molestada em me ver sendo clichê; me irrita mais por
ter de admitir essa verdade e não transpô-la, por me ver limitada por limites
há muito tempo estabelecidos.
Como transmitir a certeza, a paz, o contentamento, a
completude, a gratidão? Como descrever as sensações, as cores, os cheiros? Como
mensurar e explicar o que passa por minha cabeça nos segundos em que mergulho
em tais olhos?
Carinho, ternura, paixão, amizade, cumplicidade, sonho,
sorriso, dor, canto; a sinestesia de viver: respirar, e pulsar, e suar, e
estremecer, e sentir, e tocar, e chorar, tudo isso ao mesmo tempo.
E quando a serenidade do cotidiano toma conta, quando a
calmaria se instaura na ausência e nas reminiscências, sobra a brisa nostálgica
da sensação de vida que a tempestade trouxera. Nos esquecemos do poder
assombroso que tem a vida e suas nuances, por nos ser tão familiar e banais,
que quando se manifesta a ponto de nos tirar da rota, do eixo, lembramo-nos do
quanto é bela e vital, do quanto precisamos delas para não apenas sobreviver,
mas viver em plenitude. É quando a sensibilidade, aguçada, vê beleza em
misérias: uma flor, um raio de sol, uma formiga, uma sensação do vento frio,
uma batida de coração, um fôlego. Milagres.
Como transmitir em verso, prosa ou canção a vida pulsante e
pungente encontrada em todos os caminhos, brilhante em todos os olhos,
principalmente nums olhos? Quando uma cor de pupila, um desenho de mãos, um
timbre de voz se tornam fortaleza, refúgio, espelho, berço, lima e pólvora?
Vida. Sentir-se vivo, respirando profundamente, sorrindo profundamente, sonhando
honestamente, esperando ansiosamente por viver uma propulsão milagrosa de vida,
um discurso calado, íntimo, poderoso, mas tão trivial e cotidiano, tão pequeno
e pontual, que passa despercebido a todos o seu grau de beleza e magnitude.
Clichê? O maior deles! Tão humano, tão velho e tão novo. Ao
mesmo tempo avassalador e comedido; ao mesmo tempo público e privado; ao mesmo
tempo minúsculo e gigantesco; ao mesmo tempo sensorial e racional; ao mesmo
tempo dois; duo, dual. Único. Sinestésico e vivo. Real, tão real quanto as
almas, os ânimos, os pensamentos, as sensações são: invisíveis, universais,
parte de nós, indefiníveis; reais. Tão reais que tornam-se clichês e banais.
O mar calmo esconde uma força que todos sabemos existir, mas
não nos preocupamos com ela; uma vida que todos sabemos existir, mas não a
valorizamos; esconde verdades clichês, belezas desconhecidas e milagres
costumeiros. Só um cego sabe da beleza da luz; um náufrago, da força da onda;
uma mãe, da dor do parto; só eu sei o quanto amo.

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