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quinta-feira, 30 de outubro de 2014

Luto transcedental

"não coma da árvore do conhecimento do bem e do mal , porque no dia que dela comer, Certamente morrerá." Gn. 2. 17

A vida é feita de mortes. Antagônico ? Mas é. A cada dia que passa temos um dia a menos de vida na somatória total da contagem regressiva. Credo, Elisa, que mórbido! Desculpe se estraguei seu dia, mas é a verdade.

Não que pensemos nisso muitas vezes. Afinal, nossa vida é feita de metas e tarefas a curto prazo: despertar cedo amanhã, programar o fim de semana, pagar a conta no fim do mês. No máximo emagreceremos e voltaremos a estudar no ano seguinte. E só.

Depois de (quase) trinta anos vividos, (quase) no meio da vida útil, é que percebemos que crescer é um processo de morte. Morre nossa inocência; morrem nossas ilusões juvenis, e temos a tendência de querer substituí-las por outras; morre a ingenuidade gradualmente. Aos poucos o mundo vai ficando cada vez mais real, mais maduro, mais concreto e mais sem graça. Morrem as utopias.

Um belo dia descobrimos que aquele corpo belo, saudável, flexível e juvenil que tanto ansiávamos na adoleacência passou por nós na correria da transição para a fase adulta e nem percebemos. Sim, o tivemos, dizem as fotos.

Um belo dia vemo-nos repetindo as opções, trejeitos (e ideias, algumas) de nossos pais, aqueles que julgávamos ultrapassados.

A cada ano morre uma versão de mim. Morrem amizades, pelo menos versões delas. A cada texto que leio mato um eu pensante anterior. A amante matou a virgem, o que de ruim e bom que havia nela. A cada semana a unha que cuidei com esmero morre, o cabelo que hidratei será cortado no mês seguinte, meus móveis envelhecem cada vez que os uso (e já quebrei metade de meus copos em menos de um ano), e a cada palavra digitada em meu celular (ou tablet, ou computador, ou notebook, ou ultrabook, ou smartphone, ou phoblet...) ele se torna um pouquinho mais absoleto.

Todo conhecimento é morte: mata a inocência do não conhecimento, mata a confiança cega sem pensar, mata no que se cria há segundos atrás.

Cada fase de qualquer coisa é morte da anterior. E sei que parece pessimismo, mas nâo é!

Veja bem: meu namoro matou a paquera, o noivado matou meu namoro, que morreu na noite em que casei. Mas que jeito glamoroso de se morrer, não? E aos 3 meses matamos a lua de mel (ou não?...), depois de alguns anos não seremos mais recém-casados. E vamos morrer, de fato, um dia.

Então estou de luto. Porque levei mais de um segundo, ou um minuto, para escrever este texto até aqui, e outra de mim morreu.

...

O problema é que se levar isso a sério fico em silêncio para o resto da vida (ou da morte)!! Não dá!

Concordo, portanto, com os gregos que o importante é morrer bem. Nada como a bela morte! Meu casamento foi a morte mais bonita que meu namoro poderia ter! O diploma foi uma boa morte da faculdade.

Também concordo com Bandeira que a consciência da morte nos dá a possibilidade (e sensibilidade) de desfrutar melhor de feixos de vida, ou de aumentar o número de deslumbramentos.
Carpe diem, pessoal!!

Não importa qual filosofia nos agarramos para explicar e existência, ou qual postura tomamos com os segundos que nos resta.

Eu, particulamente, como cristã que sou, defendo que cada dia é uma oportunidade a mais para conviver intimamente com o Eterno (e friamente falando, isso dá um nó filosófico, pensar que a eternidade ama a finitude e quer dividir com ela seu parco tempo disponível, até que a faça de fato eterna...xiii, neurônios dando piruetas). Mas vai de cada um.

Então, querido leitor, acabei de matar, talvez, o discurso da eterna juventude, o do amor romântico eterno e posso ter te deixado meio down; sinto informar, mas acabo de te matar, já que nunca tinha pensado nisso!

E Adão achou que Deus falava só do corpo físico: sabe de nada, inocente!!

domingo, 17 de agosto de 2014

Deleite-se e espere: surpreenda-se!

"Deleite-se no Senhor, e ele atenderá os desejos do seu coração [...] Descanse no Senhor e aguarde por ele com paciência."
Salmos 37. 4, 7a


Significado de Deleitar: http://www.dicio.com.br/deleitar/
Ocasionar prazer em; deliciar-se; possuir sensação de contentamento; satisfazer-se.



Um dia em minha história entendi o significado profundo e coerente deste texto e o abracei, com força. Fiz dele meu mantra pessoal, meu guia cotidiano. Essa é uma lição constante, admito. O apliquei em algumas áreas de minha vida, anos atrás, e sou profundamente grata a Deus por Ele ter sido fiel à sua palavra. Em outras estou aprendendo. O Senhor faz-me lembrar da história que vivemos, e deixa-me sensível para ver seus frutos e aprender com eles que vale a pena, sempre vale a pena. 

Mas tenho visto muitos usarem este texto, e outros, para distorcer o evangelho e o caráter de Deus, como se os evangélicos fossem um povo predestinado para prosperar, prosperidade essa terrena e vazia. Usam exemplos do velho testamento, quando Deus construía um povo para seu propósito maior de revelar Cristo, e por isso mesmo os protegia e os prosperava, retiram textos de contextos e ousam dizer que são marcados para vencer, ou seja, ter carros, propriedades, grandes templos, glamour e autoridade humana: ser um astro!

É uma pena, e espero que o Senhor seja misericordioso, porque a verdade libertadora, transformadora, edificante não é dita. A verdade que cabe a qualquer um, independente do bolso; independente da cor da pele, da nação, da cultura; independe de absolutamente nada: Deus é gracioso e benevolente! Sua graça vai além de sua justiça, a cobre, a ressignifica. Superabunda!

Por tudo isso gostaria de explicar, de forma clara, o significado real desse, e de outros semelhantes, textos. Para mim esse resume todos os outros, eu diria que a Bíblia quase toda, se tratando de promessas de bênçãos.

"Deleite-se no Senhor, e ele atenderá os desejos do seu coração". Primeiro, uma aula de português (claro): Há aqui duas frases, ligadas por uma letrinha e. Frase 1: Deleite-se no Senhor. Frase 2: Ele atenderá os desejos do seu coração. O e é a partícula que liga tudo, e poderia facilmente ser trocada por logo. Ela é condicional, e não somatória apenas. Poderíamos ler da seguinte maneira: Deleite-se no Senhor, e então ele atenderá os desejos do seu coração.

Para ter os desejos do coração atendidos por Deus você precisa ser alguém que deleita-se Nele.

O que nos leva à primeira palavra. Como mostra a definição do dicionário posta acima, deleitar-se é ter prazer e satisfazer-se. Ou seja, ter prazer na PESSOA de Deus, e satisfazer-se DELE. Quem Deus é basta! Seu caráter, Sua vida, Sua presença satisfaz ao ponto de não precisar de mais nada. Dá prazer, dá contentamento. O simples fato de andar com Ele e de conhecê-lo de verdade é prazeroso. 

Mas deleitar-se não é algo passivo, automático. É, antes, uma tomada de postura. É deliciar-se.

Procurei a palavra no google e busquei imagens (faça o teste). O que aparece? Uma taça de sorvete de dar água na boca; um violinista no ápice de seu momento performático; uma banheira de espumas... Para tais coisas você para tudo para CURTIR! Você escolhe estar ali, você escolhe separar tempo, dinheiro, momento, lugar para desfrutar de algo prazeroso. É possível ouvir uma boa música mecanicamente; é possível comer boa comida tão rápido de forma a mal sentir o gosto; é possível passar pelas coisas boas da vida e não dar valor. Mas deleitar-se nelas é desfrutar delas com prazer, é deliciar-se delas! É escolher dar àquilo seu devido valor e importância.

Há quem ouça falar de Deus. Há quem O conheça de fato. Há, inclusive quem ande com Ele. Mas são pouquíssimos, pelo menos que eu conheça, que se deleite nEle! E não dá para confundi-los! Você precisa admitir, por exemplo, que não dá para estar apaixonado e não sorrir, ou comer uma comida deliciosa e não soltar um hummm..., muito menos pular de paraquedas e não gritar! Somos seres expressivos, e fica marcado em nosso rosto emoções intensas, principalmente as de prazer. Os que se deleitam no Senhor demonstram isso nos gestos simples do cotidiano, no linguajar, nos trejeitos, no brilho dos olhos, na serenidade, na... Poderia ficar aqui a noite inteira!

Jesus, a personificação de Deus, Sua imagem de forma tangível e palpável, viveu isso várias e várias vezes, e estimulou isso. Vejam a lição de Marta e Maria; a lição dos Doze em contraposição a João, o discípulo amado. Não foram seguidores atrás dele por pão, apenas; não foram seguidores por necessidade e fé, apenas; não dividiram com ele uma história, um ministério, apenas; deleitaram-se nele!

Deleitar-se não é apenas conhecer, muito menos se restringe a temer ou obedecer, vai além: é ter profundo e sincero prazer na pessoa de Deus; é satisfazer-se dEle.

E quando digo dEle, não disse Suas bênçãos, ou a prosperidade que se espera receber. É satisfazer-se dEle por Ele mesmo!

Parece agora antagônico a parte b do texto que diz "e ele satisfará os desejos do seu coração". Se estamos satisfeitos da pessoa de Deus, o que mais poderíamos desejar? Exato! Não que não se deseje nada. Temos sonhos, temos alvos, temos expectativas, e seria hipocrisia dizer que não. A questão é que tais desejos não serão mais o centro de nossa vida, o centro de nossa existência e nossa razão de ser. Nossa postura interior muda de preciso ter senão morro e quando tiver serei feliz para gostaria de ter, mas se não tiver não tem problema, e se tiver estarei no lucro! É uma mudança drástica de paradigma. Nossos sonhos e desejos não podem ser nossos deuses. Só Deus é Deus, e ele não divide sua glória com nada nem ninguém (Isaías 42.8). Ele não quer ídolos em nossas vidas, nem em nossos corações, mesmo que seja nosso sonho mais precioso, e mesmo que esse sonho seja agradável a Seus olhos! Ele mostrou isso a Abraão. Isaque foi dado por Deus, era caro a Abraão, era seu tesouro precioso esperado por anos; era seu sonho, seu maior desejo. Ao pedi-lo para Si, Deus queria que Abraão provasse que seu filho Isaque não ocuparia o lugar de Deus em seu coração (Gênesis 22.1-18).

A partir do momento que nos deleitamos no Senhor, nossos desejos estão submetidos a Ele: Seu tempo, Sua maneira.

Abraão levou 25 anos para ver seu desejo realizado. Seu neto Jacó levou 7 anos para ter Raquel, e trabalhou por ela mais 7 anos. O povo andou 40 anos no deserto, e por 40 anos Josué e Calebe aguardaram o tratar de Deus na nova geração para pisar na terra que tinham visto com seus próprios olhos ali, a metros deles. Ouvi uma vez um ministro de louvor usar a frase que explica a existência do versículo seguinte com que abri este texto:

Toda promessa passa pelo teste do tempo.

Deus nos faz esperar. Para brincar conosco? Para rir de nossa angústia? Não: para aprendermos a nos deleitar NELE, e a DESCANSAR nele. E isso é trabalho de formiguinha, de persistência. Você busca a presença de Deus por Ele mesmo, e espera Ele agir, descansado na certeza de que vai cumprir a sua promessa... hoje. Amanhã será o dia... #só que não. Nem depois de amanhã, nem na semana seguinte. Você começa a desistir, deixa de ter prazer Nele. E por quê? Por que o coração tende a buscar as bênçãos do Senhor, e não o Senhor das bênçãos! E quando não temos o que queremos agimos como crianças mimadas: emburramos, ficamos de mal. Há quem abra mão de Deus por não ter recebido o que queria, quando queria.

O tempo é para nos tratar, e nos lembrar que quem nos satisfaz é o Senhor em si, não suas bênçãos! E se ele explicitamente prometeu, vai cumprir, Ele não é Deus? Deus nos molda com o tempo, nos aproxima dEle, nos ensina a esperar por Ele, a ansiar Seu agir, a aprender a descansar na fidelidade de seu caráter. Resumindo: Deus nos faz esperar para termos o privilégio de conhecê-lo!

Minha experiência diz que quando demora demais, mas ao mesmo tempo o prazer está no Senhor, uma hora você deixa de desejar aquilo, ou de esperar ansiosamente, pelo menos. Já viveu tanto tempo sem o objeto desejado que começa a acreditar que realmente sobrevive sem tê-lo! Para de esperar a promessa, e começa, de novo, a curtir o próprio Deus, a realizar-se nEle, a deliciar-se nEle.

TCHARAM!!

Então Deus nos surpreende com uma versão melhorada, um upgrade do nosso desejo mais precioso, ansiado, chorado. De repente Ele atende ao desejo do nosso coração!

Mas quero deixar bem claro uma coisa:

Deus atende o desejo quando este desejo deixa de ser seu senhor!

E por isso mesmo nos surpreende, porque a essa altura nem precisávamos mais dele!

...

Concordam comigo que tudo isso não tem nenhum, repito, NENHUM ponto de contato com teorias de prosperidade? Biblicamente falando, Deus faz próspero apenas aqueles que não precisam mais ser prósperos para serem plenos, para serem felizes, para deleitar-se na vida. Ele dá o que não mais precisamos, e dá para demonstrar seu carinho, seu amor, para mimar aqueles que já estão por perto dEle verdadeiramente e apenas POR ELE! 

Esse tipo de bênção não afasta as pessoas de Deus, as aproxima pela gratidão, e pelo fortalecimento que causa a um relacionamento JÁ sólido. Também não humilha outros, ou rebaixa aqueles que não receberam o mesmo, porque fica claro a todos que é algo fruto de um relacionamento de amor. Quem recebe este tipo de bênção não se vangloria dela, mas aponta para a magnitude de quem deu. No fim, Ele é fantástico, não o presente!

E assim você se vê desfrutando de alegria, de júbilo, de contentamento, por receber sempre mais e além do que realmente precisa. Afinal, nosso deleite está no Senhor! E Deus, em sua imensa bondade, nos enche de mimos desnecessários, como um pai faz com o filho recém nascido, porque seu prazer maior está em apenas tê-lo!

Por desfrutar de presentes recebidos assim, por graça e carinho de um Pai que me ensinou a esperar Nele, vivo abundantemente algumas áreas de minha vida. Minha luta é viver isso em todas elas, e divido o desafio com vocês!

quinta-feira, 26 de junho de 2014

Tô cheganu...

Ministério e missão. Duas coisas distintas, e eu nunca pensei nisso. Ministério é para os de dentro, missão para os de fora. Trabalho é o que paga as contas, profissão é o que abraçamos, carreira se constrói com o tempo, família também.

A vida é complexa...

Inocência nossa achar que vamos facilitar, que estaremos imunes às dores, à vida cotidiana, às crises e apetites clichês. E depois de muito nos pegamos perguntando: e agora, José? Abraço as belezas e prazeres da vida medíocre, sem o sentido pejorativo, e vivo simplesmente, ou mergulho, fundo e de vez, no universo das ideias, dos projetos, das digressões, do aprender constante? Serei mãe, sim, um dia, mas isso basta? E não basta? Ser intelectual nos faz melhores ou apenas mais chatos?

Com certeza nos faz solitários, em certa medida. Mesmo casados, mesmo com filhos, mesmo com amigos. Há certa solidão na inteligência, certo quê de ermitão no aprender contínuo, na visão crítica. Poderá alguém viver a vida cotidiana mesclada às viagens elocubratórias? Posso pensar em Descartes e Antonio Candido enquanto lavo e passo as roupas? Posso atingir o sublime enquanto pago contas?

Preciso crer que sim. Pronto, falei: eu PRECISO! Uma hora na vida paramos de fugir de quem somos. Sim, porque todos passamos pela fase de tentativa de adaptação. Você abre mão um pouco de quem é para não estar só, para ter amigos, para ser capaz de falar de novela e copa do mundo. Vai a churrascos, encontros triviais, passeios em shoppings e finge gostar apenas pela vontade de fazer parte, de não ser tão esquisito. E nessa fase negamos a personalidade faminta de ideias e conceitos, de projetos e revoluções, de sonhos densos que somos. Rejeitamos-na como quem tenta largar a bebedeira costumeira. Como o mineiro tentando fazer o R paulista para parar de ouvir chacotas. Chegamos ao absurdo de comprar pão de queijo escondido, e fingimos adorar pastel de vento.

Mas depois de um tempo, perdemos a paciência e a vida nos ensina que é bobagem querer ser quem não somos. Então, dane-se: não curto novela, não faço ideia quem entrou no Big Brother, sou capaz de deixar o salário numa livraria e horas de vida numa conferência inteligente. Detesto andar a esmo por shoppings, mas adoro fazer o mesmo em museus. Não ligo de lavar e passar minhas roupas, desde que possa desligar o rádio pop e ligar na MPB. Sim, eu curto MPB, não importa que ‘só’ tenha 20 e poucos anos. No momento estou mais para ‘quase trinta’ mesmo! E adoro pão de queijo, cuscuz, doce de leite, polenta, quindim, leite gordo quente com chocolate e uma pitadinha de canela pra esquentar um cadin no frio! E aquele rai de pastel vazio não, não tem graça nenhuma!

Sim, sou a intelectual de fala difícil, leitura difícil, poucas palavras, riso tímido e cara de séria. Sou a garota mineira que gosta de colo, silêncio, violão, carinho, um bom livro e um cadin de tempo livre pra pensar no que leu. Sou a que gosta de prosear, filosofar altas horas da madrugada sobre teologia, filosofia, literatura e música. Nada prática, super densa, adora um mundin seu.

E ainda sou aquela careta que veste o blusão da faculdade com orgulho, apesar de parecer brega, e que gosta de ir lá andar pelos corredores e praças, em meio a uma turminha sonhadora, ouvir balela e causo de professor antigo e tomar um refri na cantina, reclamando do busão, do frio, do professor antigo que não parava de falar... Sou daquelas que sente falta do que mais detestou na vida: acordar cedo pra assistir aulas e aulas e debates e anotações e mais aulas e pesquisas e trabalhos e pilhas e pilhas de livros e cópias de livros. Sinto falta.

Então, aos ‘quase trinta’, a gente desencana e volta a ser o que se é, uma mistura de tudo da vida. Sou mineira enrustida, paulista por opção e correria, dona de casa por efeito colateral de ser independente mulher amante de um paulista do interior, intelectual por precisão e por prazer, leitora ávida e preguiçosa, que espera um frio e uma boa chuva para se enrolar nas cobertas com um livro no colo, por puro pretexto de “não dá pra fazer mais nada” (sei...). É só parar de malhar pra eu engordar aqueles quilinhos de novo, o pior é que não me incomodam tanto mais. Depois de tudo vejo-me voltando pra faculdade fazer licenciatura, lendo artigos de criação de filhos e compra de carros, arranjando tempo para arrumar as unhas e lavar a louça, no mesmo dia.

Tô ficando cada vez mais eu... Bão também, uai!

E as perguntas de outrora, o que fazer da vida, paro de fingir que estão resolvidas, mas não tenho mais a pressa de anos atrás. Agora a gente se permite crescer com o tempo, construir-se. Tendo um trabalho que pague as contas, um ministério que edifique, um relacionamento refrigério-refúgio, pode-se andar, divagar, pensar devagar, ler devagar, sem a pressa desesperada de entregar o livro na biblioteca. Oras, compre-o e leia o tempo que quiser! Mastigue, rumine... Leve tempo! Descubra sua missão de forma sólida, aos pouquinhos, um passin de cada vez, um tirim de’spingarda, pra virar um trem bão, sô, desses de encher a gente de vida e de orgulho!

Estou assim, desacelerando, ao compasso mineiro de esperar a massa crescer e cozinhar em banho maria a forno de lenha algo denso, com “sustânça”! Com o tempo queremos conteúdo, pé no chão e fortaleza. Nada de paixão passageira, emprego passageiro, sonhos rápidos e inconstantes. Algo de trabalho de formiga nos inquieta.

Perto dos trinta começo a pensar em legado, a ser cobrada a ter filhos, e a querer fazer parte de algo maduro, tipo missão da vida toda. E para uma intelectual mineirinha abduzida pela correria e anseios do capital paulista, não se trata de “arranjar um filho”, té porque, coitado do guri já nascer com a responsa de ser a solução para os problemas de identidade da mãe: não, fala sério, meu! Pé no freio, mas bora que atrás vem gente... Prefiro um cadin de vez por vez!


Com o tempo a gente assume o que é, e eu sou mais mineira que paulista. Vou devagar, mas com pé na serra. Devagar, mas querendo praia. Legado não se constrói a ritmo de metrô, mas nem de mula. E a vida está mesmo mais parecida com as estradas de Minas do que com o Rodoanel: a gente desvia de buracos, cai em uns, pega chuva, escorrega no barro, mas chega lá... Uma hora, a gente chega! 

Põe água no feijão e limonada na geladeira, gente, que to cheganu!!

segunda-feira, 2 de junho de 2014

Crônica de uma doce insônia

Pesadamente, depois de algum esforço, abri os olhos. Ainda nevoados de sono, precisei acostumar-me com a escuridão. Minha pele formigava, e o contato dela com a coberta morna era enebriante. Ainda ébria de mim, de nós, com os reflexos um poucos lentos, confesso que assustei quando percebi: eu estava viva!
E no espanto da conclusão olhei para minhas próprias mãos, movimentei os dedos embasbacada, como se fosse a primeira vez que o fazia. Respirei fundo: havia ar em meus pulmões! Nossa.... E meu coração batia cadenciadamente. O mais impressionante era o silêncio interior. O mais impressionante era a quietude. O mais impressionante era a paz!

Onde estava aquele aperto no peito, a angústia que vibrava em meus peito e ressonava em todos os poros como sinfonia cruel? Onde estava o medo dilacerador e paralisante que tantas e muitas vezes me tirou a fome e o sorriso? Para onde foi a certeza trucidante da falta de amor, da solidão, da incapacidade de gerar ternura? E para onde escorreram as lágrimas constantes, silenciosas e frias que desciam em meu rosto e faziam-me acordar mais morta-viva, a cada dia?

Acordei sonolenta, morna e livre. Não que tenha sido a primeira vez que estivesse livre, mas de vez em quando sinto a liberdade pulsando como se a tivesse acabado de conhecer. Eu estava viva, e como era grata por estar! Como era grata por poder abrir os olhos ali, e sentir a vida pulsar em meu corpo cansado e ébrio, morno e plasmo fluido de fluidos e memórias vivas. Denso de cores, de sensações e de paz. Denso de plenitude!

Estendi a mão para tocar. Sim, às vezes precisamos tocar. Não que seja falta de fé, mas é a necessidade de convencer o próprio cérebro de que o que se vê a centímetros do nariz não é miragem. E mesmo que passemos oras deslizando os dedos, alisando a concretização de sonhos, parece não ser o suficiente. Não é o suficiente para abafar o coração acelerado e represar as lágrimas, de alegria, que descem sem permissão por nosso sorriso. Queremos agradecer a Deus, ao mundo, ao universo, pela dádiva de estarmos vivos ali, experimentando algo pequeno, mas fantástico!

Não importa o objeto que nos transpões para tal momento de contemplação da vida, e já tive vários deles: um filhotinho de cão, belo, fofo e quente; uma flor pequena e aveludada; o mar; o sorriso do amigo querido; o presente de aniversário tão sonhado; o abraço de quem se tem saudade; o mergulhar nos olhos de alguém especial; o carinho de pessoas exemplares e seus conselhos sábios; a companhia de um sábio; o colo de mãe; o colo de pai; o abraço sincero e carinhoso dos irmãos, dos primos, dos amigos-irmãos; o beijo na grande paixão; a intimidade do grande amor; a conquista de tesouros pessoais; uma boa música; um bom livro; um bom doce; uma comida saborosa; chocolate quente no inverno e banho de cachoeira no verão. Seja o que for, sentimos o coração acelerar, e nos lembramos que, surpreendentemente, e apesar de tudo, estamos vivos, o suficiente para desfrutarmos daquilo.


Um dia abri os olhos e deparei-me com a verdade de que viver pode ser pesaroso, doloroso, frustrante até. Aprendi com os anos que sonhos são esmagados às vezes, medos são sufocantes, nosso corpo adoece. Às vezes nos sentimos impotentes, pequenos, inúteis. Outras quebrados, imprestáveis. Queremos ser mais do que podemos, ou precisamos, muitas e muitas vezes. Deixamos de ser tudo o que somos tantas vezes, apenas por não enxergarmos valor nisso. Mas às vezes a vida mostra seu brilho. Às vezes encontro-me com o divino das coisas, e com a presença divina do Divino.

E às vezes, surpreendentemente percebo que sou viva, e que ela, a vida, pode ser sublime. Às vezes sou capaz de desfrutar de sua beleza em alumbramentos. E são esses os momentos que, de todo coração, gostaria que fossem absolutamente eternos. Para eles, para tê-los, acordo todos os dias, na expectativa de tocá-los novamente!

sexta-feira, 2 de maio de 2014

Faz tanto tempo...

Olá, caros!

Sim, sim, estou viva! Sei que faz anos luz que não veem algo novo de minha humilde pena (ei, vocês ainda estão aí, não é? rs), e peço desculpas, por obséquio!

É que... casei! E com o novo status de facebbok, e novo estado civil, herdei menos tempo livre, mais ideias e mais cansaço. Trabalho o dobro, durmo a metade, e o que escrevo tem sido notas e ideias em papéizinhos, entre um horário de almoço e outra tarefa qualquer.

Sim, elas existem: ideias, projetos, esboços. Testículos esparsos, nos cantos dispersos de meu dia a dia tumultuado. Mas estou aqui não apenas para dizer que estou viva, e ainda escrevo, como tenho também lido muito, mas inclusive para dizer que textos novos virão, para vossa alegria (e minha, que estava morrendo de saudade disso...).

Enfim, vemo-nos em breve!

Por ora, peço encarecidamente que releiam seus textos preferidos, comentem, curtam e deixem recados. Façam sugestões de temas, perguntas de gramática, indiquem livros.

Meu blog pretende-se um portal de "um cantinho, um violão [...] muita calma pra pensar": aconchegante e de todos!

Beijos e textos

ES(G) - é, aumentou meu sobrenome...

sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

E quem disse que um escritor dorme?

 Primeiro, escritores levam certo tempo para "saírem do armário". Sim, porque não é fácil assumir que, no fim, a coisa que você melhor faz não dá dinheiro, nem todo mundo se interessa, pode te falir, pode ser um hobby frustrante, e te aliena um pouco do mundo, mesmo quando te aproxima de tudo. É duro admitir que sua melhor habilidade é escrever.

Segundo porque um cérebro de um escritor não funciona de forma óbvia. Acumulamos informações, cenas, piadas, tons, expressões e impressões ao longo do dia inteiro enquanto trabalhamos (é óbvio que nem todo escritor vive de escrever, e claro que todos sonham com isso), e quando o mundo desliga e silencia, ele cisma de ligar as sinapses nervosas e falar, falar, falar, falar e falar, até você não aguentar mais e sentar-se a frente de um computador para "psicografar" ideias próprias.

Quando não aguentamos mais, dormimos (quando podemos) ao longo do dia, enquanto as pessoas normais estão vivendo vidas normais, capitalistas ou não. Acordam, trabalham, planejam, sonham, briga, se irritam, se estressam, comem, vão para casa, ouvem música, tomam banho, transam e finalmente desligam. Alguns profundamente, outros nem tanto. Mas repõem as energias para viver um novo dia no dia seguinte.

Escritores não. Não temos esse preconceito de ver cada dia um dia, como blocos unitários independentes, separados entre si, ciclos finitos e conclusos ao repousarmos a cabeça. Nosso tempo é continuum. Ações de um dia refletem no dia seguinte, conceitos são construídos ao longo do tempo, e o mundo é o mesmíssimo à noite, com exceção de, basicamente, menos luz disponível. As árvores estão lá, os prédios também. Menos as pessoas, que estão em casa para seu rito de passagem diário e habitual do sono dos justos.

Os que já tiveram o privilégio de passar uma noite em claro, digo uma noite inteira, sabem da sensação de nada ter terminado ou começado: são apenas fases interligadas. Os dias e noites se revezam como capítulos de novela, ou parágrafos de um enredo conciso, coerente e contínuo. A vida não pára ao dormirmos. Só nós que nos esquecemos dela.

Bom, escritores não se esquecem. Uma noite de sono não nos faz esquecer promessas, por isso somos amantes perigosos. Não nos faz acreditar que tudo vai mudar no dia seguinte, porque nossa experiência diz que o texto estará lá, exatamente onde o deixamos. Nosso corpo, às vezes, desliga para manutenção. Não nossa mente.

Escritores sonham enredos, e criam enredos a partir de sonhos. Já escrevi contos de meus pesadelos. Para mim, meus sonhos é a parte mais esclarecedora, quando meu cérebro não precisa gastar tanta energia em manter um corpo ativo, e pode se concentrar em pensar, e digerir impressões, conscientes ou não. Então os coloca em ordem, e escreve um enredo coeso e lógico (ou ilógico com certa lógica...).

Sabe quando percebemos que, independente do trabalho que nos dá a renda necessária para viver, somos, no fim, essencialmente escritores? Quando percebemos que não dormimos, de fato, como todos os outros. Mesmo quando dormimos.

A todos vocês, uma boa noite!